07 February 2011

Sobre o limbo

Brasileiros na Inglaterra são turistas, imigrantes econômicos ou sociais*. Há muito pertenço ao último grupo. Com orgulho típico de brasileira classe média. Na minha cabeça média minha vida no Brasil era muito mais confortável do que aqui.

Mas quando o assunto é economia, divisão de classes, violência e conforto material a idéia de que o Brasil está bombando e a Inglaterra afundando ainda está mais no Guardian e na The Economist do que no dia-a-dia.

Com a perspectiva de voltar me vi obrigada a me imaginar de volta em São Paulo. Todos os dias dormindo, acordando, trabalhando, comprando... e no Brasil há-se de comprar tudo – escola, médico, segurança...

Ontem, entre as prateleiras do Tesco - onde escolho o que quero sem olhar o preço - fiquei pensando na minha vida em Brighton. Na cidade pequena, na beira do mar, ao lado de Londres. Adoro minha casinha vitoriana, meu carrinho coreano, minha vida confortável de classe média inglesa. Mas isso foi ontem. Em outros dias odeio o frio, a falta de sol, a solidão da minha casa e da minha vida de estrangeira.

A sensação de não estar nem lá nem aqui saiu disso e continua nisso. E hoje minha tranquilidade-e-conforto-materiais pesam nas minhas decisões tanto quanto os outros fatores da interminável lista que me puxa de volta à Terra Brasilis. O limbo é essa necessidade amedrontada de deixar pra trás o que eu conheço e me atirar em um mundo novo, que deveria ser home, mas não é mais.

*essa classificação é geral e simplificada, para determinar o contexto sem comprometer a cadência do texto. A sociológa dentro de mim e a antropóloga Ana Paula Figueiredo não permitiriam esse desleixo na exatidão da informação.

5 comments:

Marilia said...

Querida Ananda,
sinto muitas coisas parecidas com o que tu dizes.
Acho que quando estamos fora perdemos um pouco do senso do que é o nosso Brasil. Saudade, utopia, alegria, sol, cor etc...É quando páro pra pensar de verdade, comparo as duas realidades, ponho na ponta do papel os preços de tudo (incluindo a educação, segurança, sáude, coisas que aqui não se pagam) fico em dúvida. Tem sempre uma parte de mim que grita pedindo pra voltar pra casa. O difícil pra mim é saber o que é de fato essa "casa". Aqui eu tenho uma, lá eu tive.
Enfim, te exponho um pouquinho dos meus pensamentos pra te mostrar a consfusão que há dentro de mim tb.
Bjinhos,
Marília

kalina morena said...

muito bonito o seu texto.
abraco
Kalina

Anonymous said...

Oi meninas...(eheheh)
Eu também vivi fora por vários anos, em alguns lugares, até muito diferentes entre si. Em todos fui muito feliz (não dizendo que foi fácil!). A idéia de compreender, aprender e me integrar em uma nova cultura era sempre maior do que o temor ou a saudade.
Nunca comparo o Brasil com o pior ( que é claro existe!), sempre comparo com o que é melhor no mundo, é mesmo mania de brasileiro... só que, diferentemente do "nacionalismo exacerbado", eu nunca quero voltar!
O Brasil é lindo para passear... ah, como é bom passar uma semana na Ilhabela... no Rio de Janeiro etc... visitar a família!
Mas viver o dia a dia... este nem pensar! Todas as três vezes que tive que voltar a viver aqui (em São Paulo)só mesmo fazendo terapia...
Agora, estou de volta mais uma vez, esta é a pior de todas! Pior que o custo de vida caríssimo e todas as vicissitudes de um mundo subdesenvolvido e mal governado é a mentalidade das pessoas que mais me assusta...
Desde a falta de educação do dia a dia, a falta de conhecimento e a ousadia de tudo saber. Não existe humildade nem entre os humildes!
Estou desolada, este não é o meu país, não é o lugar aonde estudei, me formei, trabalhei, dentro de uma mentalidade moral e ética que me permitiram fazer parte deste mundo internacional que avança para uma universalidade real, a despeito das dificuldades culturais.
Cada vez mais o Brasil se afasta do resto do mundo civilizado. Regredimos qualitativamente em quase todos os itens, mas todos os dias nos massacram com dados estatísticos quantitativos de vultos duvidosos.
A mentira, a enganação e a trapaça são corriqueiras e correntes, em todos os níveis. O brasileiro se acha esperto em ludibriar o outro... lastimável!
Vivemos longe de tudo, mas o brasileiro acha que tudo é que é longe... Há uma diferença brutal nesta colocação!
Me sinto uma paralítica mental, uma 'alien"...
Perdoem meu desabafo, aproveitem e valorizem cada dia em um lugar capaz de ter tradições, respeito e conhecimento e ver que seus filhos aproveitam isto.
Lá, muito mais que cá, tem a "casa" que protege e dignifica, que avança, que te faz crescer interiormente e exteriormente!
sejam felizes, beijão, Layla Fiusa.
laylaf@uol.com.br

purple said...

Pois é, eu acho mesmo que este sentimento é geral de quem anda nos dois mundos.... impossível um deles ser perfeito... O ir viver noutro País implica que nada volte a ser como antes... nem as prateleiras do supermercado!
e vai-se sempre sentir saudades de um lado e do outro....
Morei pouco tempo em Londres, mas ainda hoje sou invadida com cheiros, cores, sensações daquela cidade, e tenho tantas saudades. Mas não são mais do que as que tinha de Lisboa quando lá morava.
Difícil encontrar o meio termo entre as duas.

Livia Mata said...

quanto mais leio, mais me identifico.